sexta-feira, novembro 03, 2006

Preconceitos


Aqui, em Lisboa, fazíamos bem em escutar este homem sem o habitual preconceito. O homem diz muita coisa acertada. Não tem é o look certo para este tempo de político regido por mago brasileiro do marketing.É que esse preconceito em relação ao homem – no qual me incluo, mea culpa – esconde muita coisa. Esconde, por exemplo, o facto de Lisboa não gostar de ser afrontada por mais nenhuma região. Onde é que estão os gajos do Porto? Mexam-se. E Braga? E Coimbra? É só garganta. Toda a gente fala muito, mas depois metem o rabo entre as pernas e estendem a mão para a migalha de Lisboa. Este homem, pelo menos, goste-se ou não, fala e faz. E por isso entra em choque com o verniz de Lisboa. Nos EUA, na Alemanha, no UK (isto é, nos países mais ricos), existem dezenas de Albertos Joãos. Irritam as elites centrais. Pois. Irritam porque defendem as suas regiões e não as teorias. São feios, porcos e maus. Pois são. Mas defendem aqueles que os elegem. E é isso que faz falta a Portugal: políticos que defendam as pessoas e não os partidos, o regime, o centralismo de um regime que nos leva à falência. Não sei se repararam, mas passa-se isto: a Madeira quer sair, a emigração voltou (ou seja, pessoas da minha geração estão a repetir o trajecto dos meus avós, estão a sair para o estrangeiro porque Portugal "não dá"), uma legião cada vez maior olha para Espanha, os orçamentos são incontroláveis, etc, etc. E perante este cenário dantesco deixamo-nos ir na propaganda do governo e descarregamos a raiva no Alberto João. Que conveniente. Alberto João é o poste onde nós, os lisboetas, os senhores do regime, descarregamos a nossa impoluta bílis. É tão útil este bárbaro carnavalesco, não é? Pois, bárbaras são as elites de Lisboa que gerem este país há séculos com os resultados conhecidos. Aliás, podemos falar de famílias e de uma rede de conhecidos, que se tratam por tu e pelo primeiro nome há séculos, enquanto gozam com o povo, e enquanto sonham em ser franceses. Lamento, mas já não há pachorra para este circo, para este verniz lisboeta.
Depois, fico um pouco incomodado por viver numa cidade onde, sem qualquer análise, fica bem elogiar um qualquer cleptocrata terceiro-mundista, quando, no mesmo minuto, fica sempre bem dizer mal, mais uma vez sem qualquer análise e apenas com base no preconceito, de um líder democrático do meu país. Podemos ter preconceitos em relação a Alberto João, que vence eleições, mas não podemos ter preconceitos sobre um qualquer ditador não-branco. Parece-me que é, no mínimo, caricato. É como se descarregássemos o nosso racismo sobre um dos nossos, dado que é proibido ter racismo sobre um dos outros.